O Sistema
Municipal de Cultura de Salvador SMC - (lei 8551/2014) chegou em um momento
tardio, 11 anos após a regulamentação do Sistema Nacional de Cultura, porém
extremamente necessário, tendo em vista a necessidade que nossa capital tem
de implementar ao menos o “tripé” da política pública de Cultura composto
pelo Plano Municipal de Cultura, o Fundo Municipal e o Sistema Municipal de
Informações e Indicadores Culturais - o SIIC. Infelizmente, 04 anos da atual
gestão e estes dispositivos não foram criados.
O Conselho
Municipal de Política Cultural (CMPC), acaba de completar um ano de
funcionamento, órgão de controle social que também compõe o SMC, composto por
representantes do poder público e da sociedade civil. Vivemos momentos tensos
no que diz respeito à garantia da nossa função de colegiado fiscalizador,
deliberativo e sobretudo contribuinte da implementação das políticas
públicas, função por vezes desrespeitada pela gestão atual. Passamos esse
primeiro ano de funcionamento buscando condições materiais e estruturais para
exercer nossa função, bem como legitimidade na relação com a Prefeitura que é
responsável pela gestão da política pública de Cultura.
Nós,
atores e atrizes sociais, estarmos “na ponta” de onde chegam as políticas
públicas de cultura, somos capazes de construir diálogos com outros/as que
não fazem parte do CMPC e assim exercer papel representativo na sugestão das
políticas públicas que, de fato, atendam às demandas da comunidade cultural
de Salvador, diminuindo a hegemonia do poder público municipal nas
formulações destas políticas. A Secretaria Municipal de Cultura e Turismo de
Salvador - SECULT, a Empresa Salvador Turismo (Saltur) e a Fundação Gregório
de Mattos - FGM e demais órgãos da prefeitura, precisam ter o entendimento de
que o CPMC é participante da sua estrutura organizativa e, portanto, precisa
ser consultado na construção de suas ações executivas. Somente com essa ação
integrada entre sociedade civil e poder público será possível estabelecer um
processo democrático de participação na gestão das políticas e dos recursos
públicos na área cultural. Infelizmente nosso diálogo foi concentrado na FGM,
que, por sua vez, não é responsável pelos principais eventos culturais da
cidade.
Isso
evidencia a deficiência de uma gestão que não optou por criar uma secretaria
exclusiva de Cultura. Lamentavelmente
nesta gestão, vimos apenas sanção da Lei 8551/2014 - Lei do SMC e a abertura
dos trabalhos do CMPC, naquilo que podemos chamar de políticas públicas, pois,
as outras ações trataram de projetos e editais com irrisórios recursos diante
da demanda cultural que a cidade exige. Não tivemos por parte do poder
público iniciativas que garantissem uma maior autonomia de recursos e gestão
de políticas que beneficiassem a cadeia produtiva da cultura na cidade. A
Fundação Gregório de Mattos continuou refém de parcos recursos oriundos do
Fundo Estadual de Cultura e que não foram na sua íntegra destinados a gastos
exclusivos com a promoção cultural, ficando a mercê da vontade do
prefeito. Esta anomalia ocorre pelo fato da atual gestão optar pela não
regulamentação do Fundo Municipal de Cultura, que garantiria a transferência
direta dos recursos do Fundo Estadual de Cultura para o Fundo Municipal de
Cultura, bem como de outras fontes e por sua vez, exclusividade no uso dos
recursos.
Além da
não regulamentação do Fundo Municipal de Cultura, que necessita apenas de uma
Lei, de um CNPJ e de uma Conta Bancária, o Plano Municipal e o Sistema de
Indicadores Culturais também tiveram o mesmo tratamento, vale lembrar que a
Lei do SMC, a mesma que exige o funcionamento destes instrumentos, foi
sancionada em 2014, início da gestão. Travamos uma enorme batalha dentro do
CMPC e infelizmente não avançou: sobre todos os 03 instrumentos nos é dito
que estão em trânsito dentro da burocracia municipal, estamos chegando ao
final do governo, e constatamos mais uma vez, o não cumprimento da
legislação.
A gestão do atual prefeito, optou por não criar a Secretaria Municipal de
Cultura, atrelando a pauta de início à Secretaria de Educação e agora
vinculada ao Turismo, sobrecarregando as funções da FGM e tratando elementos
simbólicos, identitários, cidadãos e econômicos da nossa cultura como algo
apenas para turista ver, repetindo a velha prática do “pão e circo”, que,
lamentavelmente, tem sido a prática dos governos que estiverem à frente da
nossa cidade até os dias de hoje.
Nesses 04
anos vivemos um período no qual os recursos para o fomento da Cultura foram
em gigantescas cifras, dedicados a artistas para realização de shows nos
períodos da alta estação no Turismo de Salvador. Se comparamos com os
recursos investidos nos editais, vamos perceber que cada cachê pago a estes
artistas equivalem a quase um edital anual.
Em 2013, a
prefeitura recebeu 06 repasses do Fundo Estadual de Cultura, totalizando R$
2.055.473,71, deste o edital “Arte em Toda Parte destinou R$ 1,2 milhões para
40 projetos culturais, porém o réveillon da cidade naquele ano custou R$ 2,2
milhões gastos em 05 dias. No ano de 2014 o mesmo edital recebeu R$ 2,4
milhões, porém, para cantar em um dos maiores réveillons do Brasil - Claudia
Leitte recebeu R$ 700 mil, Pablo do Arrocha R$ 250 mil, Carlinhos Brown e
Daniela Mercury cada um recebeu R$ 200 mil. Neste mesmo ano, a prefeitura recebeu
R$ 2.178 milhões do Fundo Estadual de Cultura, acrescentando quase nada para
a realização do edital “Arte Toda Parte”. No ano de 2015 o edital foi lançado
no valor de R$ 3,6 milhões e o réveillon de Salvador custou R$ 7 milhões aos
cofres públicos. Agora em 2016, ano eleitoral, não houve edição do edital
“Arte Toda Parte”, porém já foi anunciado que Wesley Safadão receberá quase
R$ 1 milhão como cachê para seu show no réveillon de Salvador, assim como
Ivete Sangalo também receberá o mesmo valor, sem falar nas outras atrações.
Vale ressaltar que os recursos repassados pelo Fundo Estadual de Cultura
deste ano chegam a mais de R$ 1.2 milhões e não vão para o Fundo Municipal,
pois não temos lei de regulamentação e nem conta bancária.
Infelizmente,
o Conselho Municipal de Cultura não participa das escolhas e nem do valor de
contratação para estes artistas, tampouco dos eventos realizado em nossa
cidade, e também não recebemos informações sobre valores pagos. Todo o
assunto é tratado via SALTUR e gabinete do Prefeito. Assim como a população,
obtive esses valores via mídia e diário oficial do município.
Paralelo a
este cenário, a gestão gastou bilhões construindo praças e calçadões que não
ficam à disposição da gigantesca população que ganha dinheiro fazendo arte em
Salvador, só como exemplo, até instrumentos musicais são tomados pela polícia
a quem queira fazer luau na orla da Barra. Não existe uma legislação ou
política que garantam o uso destes novos equipamentos para que os/as artistas
da cidade possam expor sua arte e “passar o chapeuzinho”, ganhando de forma
honesta seu sustento. Situação semelhante vivencia também toda população que
tenta ganhar sua vida trabalhando nas praças públicas e no comércio informal
desta cidade, basta observar como são tratados/as os/as vendedores/as
ambulantes.
O que uma
cidade como nossa amada Salvador precisa é de uma gestão que compreenda que
nossa capital e seu povo sobrevive dos serviços, pois não temos pólo
industrial que supra a demanda de gerar empregos suficientes para nossa
população. Neste sentido, a cadeia produtiva da cultura cumpre papel crucial
na geração de riquezas. Partindo desta compreensão, precisamos de uma gestão
que a partir de 2017 construa novos e democráticos parâmetros ao exercício do
controle e da participação popular, criando uma secretaria EXCLUSIVA de
Cultura que dê início ao Sistema Municipal de Informações e Indicadores
Culturais - o SIIC. Com este mapeamento poderemos consolidar os Sistemas
Setoriais de Cultura, dando origem aos Fóruns Setoriais e assim criar as
condições necessárias para a efetivação dos objetivos do Sistema Municipal de
Cultura de Salvador (art. 2º e 3º da Lei 8551/2014), que é o Plano Municipal
de Cultura de Salvador.
Neste
sentido a responsabilidade da Câmara de Vereadores/as com parlamentares
comprometidos/as em fiscalizar a aplicação destas políticas públicas é
essencial, pois, não havendo parlamentares com a compreensão da importância
desta pauta, o exercício de fiscalização e de controle social se torna mais
difícil.
Os pontos que
trago, são requisitos essenciais para a vitalidade da institucionalização e
da organização de políticas públicas de Cultura e Inclusão Social em nossa
cidade. Sem isso nosso SMC não exerce sua função por completo, tornando-o
falho e ineficiente, o que exige de nós soteropolitanos e soteropolitanas que
vivem da cultura refletir que cidade queremos nos próximos 04 anos.
--
*ZUMBI SOMOS NÓS...
FREITAS MADIBA - Presidente do
Conselho Municipal de Politica Cultural de Salvador
ESTUDANTE DE CIÊNCIAS SOCIAIS - FFCH/UFBA, EDUCADOR
POPULAR
COORDENAÇÃO NACIONAL DE ENTIDADES NEGRAS -
FÓRUM BAHIA
Skype: efreitasba
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